A transferência de um padeiro para o setor de salsicharia foi considerada um dano à dignidade, honra e imagem profissional de um empregado do Carrefour Comércio e Indústria Ltda. em Belo Horizonte. Inconformado por ter sido condenado a pagar R$ 3 mil de indenização, o supermercado recorreu ao Tribunal Superior do Trabalho, mas a Segunda Turma rejeitou o agravo de instrumento empresarial.
Contratado pelo Carrefour em dezembro de 2005, o padeiro alegou que, ao retornar ao trabalho em fevereiro de 2008 após afastamento por doença, foi advertido com palavras grosseiras pelo gerente do supermercado. Ele teria dito que a empresa estava insatisfeita com sua ausência no perÃodo da doença, e que ele era uma âpessoa zero à esquerda e não fazia diferençaâ. Dias depois, o gerente alterou sua função de padeiro para funcionário do setor de salsicharia. Ao recusar-se a mudar de setor, foi suspenso por um dia. No dia seguinte, mesmo tendo acatado as ordens, foi suspenso por mais um dia, por ter argumentado que a alteração de função prejudicaria sua atividade e seu futuro profissional.
Ao ajuizar reclamação na 35ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte (MG) no mesmo mês, o trabalhador pleiteou o reconhecimento da rescisão indireta, porque a atitude do empregador, descumprindo obrigações do contrato de trabalho, tornaria impossÃvel a manutenção do vÃnculo de emprego. Além de outros pedidos, como horas extras, o padeiro requereu indenização por danos morais no valor de R$ 20 mil.
A empresa alegou que não houve desvio de função, mas não convenceu a 35ª Vara, que concedeu ao trabalhador, entre outros itens, a rescisão indireta e indenização por danos morais no valor de R$ 3 mil. Para o juÃzo de primeira instância, a alteração de função foi unilateral, e, segundo depoimento de testemunha, o trabalhador ficou abalado psicologicamente por isso.
O Carrefour recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG), que negou provimento ao recurso ordinário. O Regional considerou a alteração ilÃcita porque, ao retirar o padeiro da função em que era especializado e tê-lo colocado para âexecutar tarefas estranhas ao seu ofÃcioâ, a empresa impôs ao trabalhador âprejuÃzos de ordem profissional, o que caracteriza violação do artigo 468 da CLT e dá ensejo à rescisão indiretaâ. Quanto aos danos morais, o TRT/MG entendeu correta a sentença, pois ânão se trata de simples e normal a alteração de função, mas de medida que afeta a dignidade, honra e imagem profissional do autor, que, da função mais destacada e especializada de padeiro foi transferido para atividades comuns e fora da suaâ.
O TRT/MG negou o encaminhamento do recurso de revista ao TST, motivando o agravo de instrumento. Nele, o Carrefour alegou que a decisão regional teria violado artigos do CPC, da CLT, do Código Civil e da Constituição, além de existir divergência na jurisprudência. No entanto, o relator do agravo, ministro Renato de Lacerda Paiva, manteve o despacho do Regional com todos os seus fundamentos. Em relação aos danos morais, o ministro Renato Paiva observou ser incabÃvel a alegação de violação do artigo 186 do Código Civil, pois o empregador foi condenado ao pagamento da indenização por danos morais por estarem âpresentes o dano, o nexo causal e a culpaâ.
O relator ressaltou, ainda, os artigos 186 e 927 do Código Civil, pelos quais âaquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilÃcitoâ e âaquele que, por ato ilÃcito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-loâ. A Segunda Turma seguiu o voto do ministro Renato e negou provimento ao agravo de instrumento do supermercado. Ficou mantido, assim, mais uma vez, o teor da sentença. ( AIRR â191/2008-114-03-40.4)
(Lourdes Tavares)
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